domingo, 23 de setembro de 2012

Economia: Dois caminhos para o suicídio



Já referi, a alguns posts a esta parte, que nos encontramos num momento muito sensível da nossa vida política (abrangendo os últimos anos); temos um governo politicamente fragilizado, no meio de uma situação económica caquéctica.

Neste ponto os extremos tocam-se.

Uns - mais ligados aos sectores da extrema-esquerda - apontam um só caminho para solucionar a crise: mandar a Troika bugiar, pegar nas malinhas e zarpar.

Outros - nomeadamente o grupo ideologicamente afecto ao cumprimento do memorando  e da acepção que é possível ir mais além dele – querem cumpri-lo, revê-lo e, mesmo assim acreditam que, depois de destruído todo o paradigma económico vigente, será possível construir um sólido edifício sob as suas ruínas.

Vamos por partes.

Aos primeiros, membros afectos a movimentos comunistas, anarquistas e bloquistas (estes últimos uma mistura dos dois atrás e mais um ou dois ingredientes); devo relembrar-lhes as consequências de um default. Já nem pergunto como é que estes iluminados arranjariam o financiamento externo imprescindível à capitalização das nossas pequenas e médias empresas.

Relembro que o país que mais se aproxima de um total fecho aos mercados internacionais é a Coreia do Norte (e mesmo esta tem negócios no estrangeiro). É isto que querem para Portugal? Acredito que para alguns seria um bom exemplo de “desenvolvimento”.

Mas as consequências imediatas de uma quebra do contrato com as entidades externas trariam agravantes que os insensatos incentivadores à quebra do memorando não se recordam (ou não querem recordar). Portugal entraria em default (incumprimento), isso é certo! E consequências? Aqui estão algumas:
  • Nova moeda
  • Salários desvalorizariam (estimativas mais animadoras apontam para uma quebra de 30%)
  • O Governo teria de nacionalizar todos os bancos (já que se tornariam insolventes) e proibiria o levantamento de dinheiro
  • Teria de ser imposto um recolher obrigatório, dado que a contestação nas ruas subiria para níveis nunca antes vistos.

Do outro lado do espectro ideológico estão aqueles que querem e desejam ir mais além do memorando. Ao contrário dos primeiros, estes últimos têm mais poder visto que se encontram, actualmente, no Governo. Os resultados desta política são, até ver (e acho que já todos vimos o que tinha que ser visto), inconsequentes e contraproducentes. O desemprego está a roçar os 17% da população activa, as medidas de austeridade ameaçam levar grande parte dos salários e, apesar disto tudo, o défice teima em ser mal-comportado e não responder de acordo com o que está estipulado com o ficheiro Excel armazenado no portátil de Vítor Gaspar. Nem o FMI se revê nesta austeridade cega.

Tudo isto é embrulhado numa retórica estupidamente darwinista de que os portugueses se habituaram a ser preguiçosos; para isso se cortam feriados e se flexibiliza o mercado de trabalho (esta última medida nem seria má de todo, não fosse o desemprego crónico dos últimos anos). Os portugueses, vistos com sobranceria pelos governantes, são tomados com preguiçosos ambulantes.

Perguntam-me se há outro caminho? Sim, há! Não envolve renegar a troika, mas sim negociar com ela. Baixar os juros, rever temporalmente as metas acordadas e algumas medidas. O memorando não é todo um “pacto de agressão” (como fazem crer alguns). Tem medidas necessárias. Destaco duas: reforma da justiça (a falta de celeridade da justiça portuguesa era calamitosa) e o famoso corte nas gorduras no Estado.

Por isso sim, há alternativas e soluções. O resto são caminhos para o suicídio económico!

8 comentários:

Parvalhoti disse...

"Corte nas gorduras do estado". Acho graça não referir exemplos.

Henrique Figueiredo disse...

Caro Parvalhoti,

O mote está lançado: Serão as PPP´s (mas com mais ambição), as Fundações (mas com um trabalho sério; não é por exemplo a Fundação do Alberto João estar melhor cotada que a Gulbenkian: é uma idiotice) e quiçá privatizar CP e TAP (e deixar no posse do Estado, por exemplo EDP). Isso sim, seria sério. Austeridade a incidir unicamente em salários é que não; mesmo através de impostos: que como liberal deverias desdenhar.

Parvalhoti disse...

Como privatizar a CP? A quem? Por quanto? Idem para a TAP. Quanto dá esse "corte" todo somado?

Ricardo Lima disse...

Terão que ser cortadas gorduras muito para além do que exige o Memorando. Infelizmente, nem os cortes que nele constam foram efectuados, longe disso.

Henrique Figueiredo disse...

A quem? A TAP, que se saiba, já tem interessados. E diz-me; qual é o interesse de manter a TAP nas mãos do Estado se esta dá prejuízo e nada contribui socialmente? Quanto à CP, que se abra a propostas e logo veremos se há interessados ou não. O "corte" estará no prejuízo que deixarão de dar.

Henrique Figueiredo disse...

Caro Ricardo,

Depende do que se entender por cortes na gordura. Cortar salários a torto e a direito não será por aí. O problema não estará aí; mas sim na produtividade. Veja-se o caso do sector do calçado. Não é líder por ser barato; é líder por ter qualidade. Para produtos baratos já temos os chineses: esses aí são imbatíveis.

Ricardo Lima disse...

Caro Henrique,

A produtividade não se aumenta por decreto. Ela é, de facto, um dos grandes handicaps da economia nacional, mas, mesmo que se tomem as medidas que permitam uma melhoria, esta só irá ocorrer a médio longo prazo.

Eu não considero que o caminho passe por baixar salários. No máximo, delapidavam-se os custos de trabalho com menos regulações e descidas da TSU - descidas a sério, não 5\6 por cento. Mas, na minha opinião, a principal preocupação deve ser tornar Portugal num centro de atracção de investimentos. Isso implicaria, por exemplo, um IRC semelhante à Irlanda ou menor. O que até seria bom para a receita, dado que mesmo que a taxa, em si, baixasse, provavelmente a receita não diminuiria.

Quanto às gorduras: PPPs para começar, RTPs, CPs, Metros, STCP, Embaixadas, grandes reformas. Muito por onde cortar antes de chegar a áreas chave como a saúde e a educação - e mesmo essas terão que passar por algumas reformas.

Henrique Figueiredo disse...

Quanto à TSU ela não será uma solução milagrosa. Veja-se o caso da Finlândia; o trabalhador contribui com 7% para a TSU, e a empresa cerca de 30%. Continua no entanto a ser uma economia competitiva.

A solução passaria por tornar uma zona de atracção de investimento? Concordo em pleno. Mas antes de se baixar o IRC deveria proceder-se a uma profunda reforma na justiça. A que temos hoje afasta completamente qualquer empresa que queira ter sucesso.

Depois; porque não a abertura de mais linhas de crédito para as PME´s. Mais de 90% delas encontram-se com problemas de escoamento de produto, dada a queda abrupta do poder de compra em Portugal. Quanto ao dinheiro; poderia ser usado aquele que não foi utilizado para a recapitalização da banca.

Quanto às privatizações, concordo com algumas e nem tanto com outras. Por exemplo, a EDP. Qual foi a vantagem em privatizá-la. De que forma é que o consumidor foi beneficiado? Monopólios privados são tão maus (ou piores) do que os do Estado.

No que toca às Embaixadas, a efectuarem-se cortes, terão que ser ponderados. É preciso não esquecer da importância que a diplomacia (e não só a económica) tem na recuperação da credibilidade externa.

 
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