A construção da UE assemelhou-se, até a um certo ponto, a um
bom casamento. Foi feita com base em cedências mútuas, com acordos que
pretendiam salvaguardar a integração europeia. Falo sim, por muito polémicos
que tenham sido, dos fundos europeus que permitiram desenvolver Portugal (e
outros países periféricos) e aproximá-los do resto de Europa. Apesar de ter
havido alguma má gestão dos recursos fornecidos, houve sem dúvida uma grande
evolução económica.
Esse casamento teve o seu primeiro grande abalo económico depois
da adopção do euro. O Sul, desejoso de fugir à pobreza que o marcava desde o
século XVII, viu nas condições fornecidas pela moeda única uma maneira fácil de
escalar até ao topo. Juros baixos e uma moeda forte prometiam mundos e fundos.
Perigosa ilusão. Os países endividaram-se e não conseguiram resistir ao teste
de fogo, que foi a crise mundial em 2008, com a inevitável pressão dos
mercados.
A questão põe-se: porque é que a crise afectou especialmente
a Europa? A resposta é assustadoramente simples. Porque, e como explica George Soros, o problema da Europa seria antes político que económico. Em tom
proverbial: pôs-se a carroça à frente dos bois.
Deu-se então a divisão da União. Credores e devedores. Norte
e Sul. Surge outra pergunta. Como desfazer este nó górdio? A solução está onde
sempre esteve. Em Berlim e Bruxelas.
Em Berlim, porque
este é o líder natural desta União. Os alemães conhecem bem as suas forças, mas
também estão cientes das suas limitações. Demasiado grandes para a Europa,
demasiado pequenos para serem um grande actor mundial. Precisam da Europa e,
verdade seja dita, a Europa precisa deles. Aos alemães cabe grande parte do poder e com esse, já dizia o
tio do homem-aranha, vem grande responsabilidade. A Alemanha deverá abdicar da
sua taxa de juro negativa e mutualizá-la. Tem também que convencer os restantes
países credores a acompanhá-los.
Quanto aos devedores, terão que aprender a racionalizar. A
verdade é que a austeridade é um caminho inevitável. Quem o nega ou é ignorante
ou demagogo. Não creio contudo que haja o famigerado moral hazard, por parte dos países devedores. O perigo moral de os
países voltarem ao “regabofe” é infundado. Esta amostra das consequências de
certos desmandos já terá sido suficiente. Sei contudo, que tal acordo tácito
não será suficiente para sossegar alemães, finlandeses ou holandeses. Sim,
julgo que será necessário controlo orçamental por parte de Bruxelas.
E é precisamente a Bruxelas cabe a coordenação de todo este
processo. A cura desta desunião europeia é tarefa hercúlea, mas possível.
Exigirá perseverança e coragem, por parte dos líderes europeus. Não será feita
da noite para o dia. Pedirá ao BCE que aja, descansando os mercados, enquanto
as verdadeiras reformas são feitas. Os países devedores terão que ser austeros
(q.b. claro); e os credores solidários.
Tudo isto é necessário para salvar um casamento promissor e
um projecto ambicioso. Mas, antes de mais, há uma palavra que se impõe:
Democracia.
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